Polícia egípcia entra em greve para denunciar instrumentalização política

Polícia egípcia entra em greve para denunciar instrumentalização política

A polícia egípcia, sacudida por um movimento de contestação sem precedentes, decidiu deixar de obedecer ordens para denunciar uma instrumentalização por parte do governo.

Acusados de uso excessivo da força pela oposição e pelos jovens manifestantes hostis ao presidente islamita Mohamed Mursi e à Irmandade Muçulmana, os policiais se sentem rejeitados por seus compatriotas, apesar de afirmarem que apenas cumpriram ordens.

"Suspendemos nossas atividades por tempo indeterminado, porque nos negamos a assumir a responsabilidade pelos erros do governo, que quer nos envolver no conflito político", disse à AFP Hassan Mostafa, um coronel da polícia de Port Said.

"Toda a sociedade está contra nós, e considera os manifestantes (mortos em confrontos) mártires, enquanto nós sequer temos direito de nos defendermos", acrescentou.

No jornal Al-Chooruk, o general Hefni Abdel Tawab, da polícia de Alexandria, explica que os policiais "pagam o preço de conflitos políticos".

O movimento de contestação dentro da força policial começou há várias semanas com manifestações isoladas, mas na quinta-feira centenas de policiais entraram em greve no Cairo e em Alexandria, assim como em províncias do sul do país.

Para tentar apaziguar as tensões, o ministro do Interior, Mohamed Ibrahim, destituiu na sexta-feira o comandante da polícia antidistúrbios, e nomeou um novo chefe.

"Destituir o ministro do Interior"

Mas, apesar desse anúncio, os policiais estão determinados a manter seu movimento.

"Continuaremos nossa greve até que o governo aceite nossas reivindicações, ou seja, que mantenha a polícia distante da política, deixe de nomear membros da Irmandade Muçulmana para postos importantes na polícia e destitua o ministro do Interior", disse o coronel Mohamed Fawzi, da polícia do Cairo, ao jornal Al-Chorouk.

Nos últimos dias, a contestação se estendeu às Forças de Segurança Central (FSC, força antidistúrbios).

Em Ismailiya, no Canal de Suez, as FSC se negaram a ir à cidade vizinha de Port Said, onde os enfrentamentos entre policiais e manifestantes deixaram cerca de 50 mortos, entre eles três policiais, desde o final de janeiro. Na sexta, Mursi decidiu deixar o Exército a cargo da segurança em Port Said.

Grande parte da população tem uma imagem negativa da polícia há décadas. E, apesar da queda de Hosni Mubarak no início de 2011, que se apoiava em um extenso e brutal aparato policial, a instituição ainda é considerada um instrumento de repressão.

Segundo as organizações locais de defesa de Direitos Humanos, mais de 70 manifestantes morreram desde novembro de 2012.

Os casos dos jovens ativistas Mohamed El-Guendi, de 27 anos, e Mohamed el-Chafei, de 22, desencadearam uma onda de comoção no Egito. O primeiro morreu torturado pela polícia, segundo sua família e um comitê de médicos forenses. O segundo, que ficou desaparecido por um mês, morreu durante confrontos perto da Praça Tahir.

Para vários analistas, esta greve é uma ameaça real, no momento em que o presidente Mursi enfrenta fortes críticas, por parte da população, e uma situação econômica difícil.