Após dia de violência contra manifestantes que causou pelo menos 35 mortos, junta militar no poder anulou todos os acordos com a coligação da oposição e anunciou que vai convocar eleições no prazo máximo de 9 meses.
O anúncio foi feito esta terça-feira (04.06) pelo Conselho Militar no poder no Sudão desde a queda do Presidente Omar al-Bashir, depois de uma operação das forças de segurança para desmantelar um acampamento de protesto em Cartum que exigia a passagem do poder para as mãos dos civis.
Segundo o Comité Central de Médicos, pelos menos 35 pessoas morreram e centenas ficaram feridas na invasão do acampamento. O líder do Conselho Militar, general Abdel-Fattah Burhan, apontou o dedo aos líderes contestatários pela violência.
Numa declaração na televisão pública sudanesa, Burhan criticou as Forças da Liberdade e da Mudança, coligação da oposição, por prolongar as negociações e por excluir militares e outros grupos políticos do Sudão das negociações. Adiantou ainda que o Conselho Militar vai formar um governo interino para preparar a realização de eleições dentro de 9 meses e que o escrutínio terá supervisão internacional.
Militares e opositores tinham firmado vários acordos, como o que determinava a formação de um conselho soberano de transição, integrado por representantes dos dois grupos, para comandar o país durante três anos. No entanto, não houve consenso sobre quem deveria integrar esse órgão e, em especial, sobre a sua liderança.
Os manifestantes estavam acampados desde abril junto à sede das Forças Armadas na capital sudanesa para exigir a participação civil na transição política. O acampamento da oposição foi totalmente destruído pelos militares esta segunda-feira (03.06).
O Comité Central de Médicos, sindicato que tem prestado assistência aos opositores, aponta "dificuldades na contagem do número real de mortes devido ao cerco dos hospitais" pelas forças de segurança e denuncia ataques e detenções de profissionais de saúde.
A comunidade internacional condena de forma veemente o uso excessivo da força contra os manifestantes no Sudão. Esta terça-feira, o Conselho de Segurança das Nações Unidas deverá reunir-se para discutir a situação, a pedido de Londres e Berlim.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, "condena a violência e o uso da força excessiva pelas forças de segurança contra civis que resultaram em muitas mortes e feridos. E está preocupado com relatos de que as forças de segurança abriram fogo no interior de unidades médicas. O secretário-geral apela à contenção de todas as partes", disse Stephane Dujarric, porta-voz das Nações Unidas.
Além da ONU e da União Africana, também a França e os Estados Unidos e a Amnistia Internacional condenaram a repressão violenta e "brutal" das manifestações no Sudão.
Depois da invasão do acampamento, os movimentos de protesto e grupos da oposição anunciaram a suspensão de qualquer contacto com os militares. A Associação de Profissionais do Sudão, na liderança dos protestos nacionais, apela à "total desobediência civil" para a queda do Conselho Militar.
Mas, de acordo com o cientista político Hasni Abidi, o caos pode jogar contra a transferência de poder para os civis. "O exército está à procura de um status quo. O exército está mesmo à procura da deterioração da situação para poder apresentar-se como a única instituição capaz de restabelecer. Penso que o Sudão entrará numa incerteza muito significativa. E não estamos longe de um colapso total", alerta.