Egípcios no exterior começaram a votar nesta quarta-feira em um referendo sobre a nova Constituição, convocado às pressas pelo presidente Mohamed Mursi contra a vontade da oposição, que desejava retardar o processo.
A agência oficial de notícias do país informou que a votação já começou em diversas embaixadas egípcias no exterior, no mesmo dia em que o Exército convocou uma reunião entre facções políticas rivais, com a intenção de restaurar a unidade nacional.
O referendo constitucional no Egipto propriamente dito será nos dias 15 e 22 de Dezembro. A oposição laica defendia o adiamento da votação, por causa dos caóticos protestos no país desde que Mursi baixou, em novembro, um decreto que ampliava seus próprios poderes.
A Constituição foi redigida por uma assembleia dominada por políticos islâmicos, e a oposição teme que a nova Carta dê um caráter excessivamente religioso ao novo Egipto que surgiu depois da rebelião de 2011 que derrubou o regime de Hosni Mubarak.
Mursi está ansioso por promulgar a nova Constituição, pois só depois disso será possível convocar uma eleição nacional - o que provavelmente acontecerá no começo de 2013.
Em resposta à crescente crise política que cerca o referendo, o principal comandante militar do Egipto irá presidir uma discussão sobre a unidade nacional na tarde desta quarta no Cairo.
O chefe do Estado-Maior, Abdel Fattah al Sisi, que também é ministro da Defesa, disse que as negociações não terão caráter político. "Vamos nos sentar juntos como egípcios", disse ele.
Mursi e a Irmandade Muçulmana, importante grupo islâmico que apoia o presidente, devem comparecer.
A expectativa é de que, sob mediação militar, a oposição participe do diálogo, segundo um integrante da liderança da Frente de Salvação Nacional. No fim de semana passado, a oposição havia boicotado uma reunião de reconciliação convocada por Mursi.
"Estaremos representados. Esse é o plano até agora", disse Ahmed Said à Reuters. "Estamos começando uma reunião para decidir o nível de representação", acrescentou. Segundo ele, será decidido se cada partido da coligação enviará representantes individuais, ou se será uma delegação única.
Ceticismo nas ruas
No lado de fora do palácio presidencial, onde manifestantes de oposição exigem o adiamento do referendo constitucional, havia ceticismo sobre as novas negociações.
O Exército dominou o Egito em todo o período pós-colonial, e das suas fileiras saíram todos os presidentes até Mubarak, derrubado no ano passado. Durante todo esse período, a Irmandade Muçulmana foi duramente reprimida.
Após as eleições, Mursi isolou os generais que governaram interinamente o Egipto após a queda de Mubarak, e apontou um novo comando.
"Negociações sem o cancelamento do referendo - e uma mudança na Constituição para fazer dela uma Constituição para todos os egípcios, e não para a Irmandade - levarão a nada e não serão mais do que um espetáculo midiático", disse Ahmed Hamdy, 35 anos, que trabalha em um escritório.
Mas o facto de a convocação partir do Exército é "uma indicação para todas as partes de que a crise está chegando a um ápice e que eles precisam encerrá-la rapidamente", afirmou.
Antes, o ministro das Finanças, Mumtaz al Said, informou que um empréstimo de 4,8 bilhões de dólares do Fundo Monetário Internacional, crucial para as esperanças de recuperação econômica do Egipto, será adiado pelo menos até o mês que vem, por causa da crise.
Na terça-feira, milhares de apoiantes da oposição se reuniram em frente ao palácio presidencial exigindo o adiamento da votação.
Uma multidão maior, agitando bandeiras e pedindo a manutenção do referendo, se concentrou em duas mesquitas, e alguns simpatizantes do governo continuaram nas ruas noite adentro. Houve também protestos em Alexandria e outras cidades.
Os actuais distúrbios já causaram sete mortes em confrontos entre partidários e opositores do governo. Mas a Guarda Republicana por enquanto não usou a força para afastar os manifestantes do palácio presidencial, que está agora cercado por tanques, barricadas de concreto e rolos de arame farpado.