O aumento acentuado da asma infantil em todo o mundo nas últimas três décadas deixa os pesquisadores perplexos há bastante tempo. Eles vêm considerando explicações tão diversas quanto uma melhor higiene e as imunizações. Contudo, um novo conceito apareceu na última década.
Alguns pesquisadores notaram que a epidemia de asma aumentou rapidamente nos anos 80, aproximadamente na mesma época em que a aspirina foi associada à síndrome de Reye nas crianças. Os médicos pararam de receitar aspirina para as crianças com febre, optando pelo paracetamol.
Em um artigo publicado em 1992 no The Annals of Allergy and Asthma Immunology, Arthur Varner, então membro do programa de treinamento em imunologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Wisconsin, afirmou que a mudança para o paracetamol pode ter estimulado o aumento da asma. Desde então, mais de 20 estudos produziram resultados que apoiam essa teoria, incluindo uma extensa análise de dados de mais de 200 mil crianças que descobriu um aumento do risco de contrair asma entre aquelas que haviam tomado paracetamol.
O Dr. John T. McBride, pediatra do Hospital Infantil Akron de Ohio, publicou em novembro um artigo na revista Pediatrics no qual ele argumenta que as provas da associação entre paracetamol e asma são fortes o suficiente para que os médicos recomendem que se evite sua ingestão por bebês e crianças com asma, ou sob risco de contrair a doença.
Enzima
McBride baseou a sua declaração em diversas linhas de evidência. Ele afirma que, além do período de ocorrência da epidemia de asma, agora há uma explicação plausível para a forma como o paracetamol pode provocar ou piorar essa doença pulmonar inflamatória crônica. Os pesquisadores descobriram que mesmo uma única dose de paracetamol pode reduzir os níveis de glutationa do corpo. A glutationa é uma enzima que ajuda a reparar os danos oxidativos que podem levar à inflamação das vias aéreas.
"Quase todo estudo que procurou, descobriu uma relação dose/resposta entre o uso do paracetamol e a asma", afirmou McBride. "A associação entre idade, geografia e cultura é muito consistente", afirma.
A correlação estatística entre o paracetamol e a asma apareceu em estudos de bebês, crianças e adultos. Os estudos também descobriram um aumento no risco de contrair asma nas crianças cujas mães tomaram paracetamol durante a gestação.
Por exemplo, um estudo publicado em 2008 na revista The Lancet examinou informações sobre mais 205.000 crianças de 31 países, coletadas como parte de um Estudo Internacional sobre Asma e Alergias na Infância, conhecido como Isaac. A análise de 2008 concluiu que, nas crianças que receberam paracetamol com o intuito de baixar a febre no primeiro ano de vida, o risco de desenvolver os sintomas da asma era 50 por cento maior do que nas crianças que não haviam tomado o medicamento. O risco aumentava com o aumento do uso: o risco de apresentar os sintomas triplicou nas crianças que haviam tomado paracetamol ao menos uma vez a cada mês.
No estudo publicado em 2000 por pesquisadores britânicos, no qual foram usados dados do Isaac, descobriu-se que a prevalência da asma aumentava ao mesmo tempo que as vendas de paracetamol nos 36 países analisados. Quanto maior era o consumo de paracetamol de um país, tanto maior era a prevalência da asma.
A meta-análise publicada em 2009 avaliou que, nas crianças que haviam tomado paracetamol no ano anterior, o risco de sofrer de respiração ofegante duplicava quando comparado ao risco nas crianças que não haviam tomado o medicamento.
Infecção viral
"Nós sabemos que o paracetamol pode levar ao aumento da constrição brônquica e da respiração ofegante", afirmou Mahyar Etminan, farmacoepidemiologista da Universidade de Colúmbia Britânica e principal autor do estudo.
Contudo, Etminan afirma que ainda não está claro se o paracetamol em si é o responsável pelo aumento da prevalência de asma.
"As crianças geralmente recebem paracetamol para controle da febre, e ficam com febre devido a infecções virais, as quais estão associadas ao desenvolvimento da asma em uma idade mais avançada", afirmou Etminan. "É difícil elucidar se é o medicamento ou a infecção viral", afirma.
Outro problema potencial consiste no fato de que, em muitos estudos, os pais precisavam se lembrar com exatidão a quantidade de paracetamol oferecida à criança e a frequência. Os pais cujos filhos têm asma estão propensos as investigar os eventos que precedem o ataque, portanto, é maior a possibilidade de se lembrarem de ter oferecido o remédio a criança.
Apenas um estudo controlado aleatório investigou essa relação até o momento. Pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de Boston designaram 1.879 crianças com asma aleatoriamente a tomarem paracetamol ou ibuprofeno se tivessem febre. Os resultados, publicados em 2002, mostraram que as crianças que tomaram paracetamol para combater a febre estavam duas vezes mais propensas a procurar ajuda médica mais tarde para tratar os sintomas da asma do que as que tomaram ibuprofeno.
Outros estudos fazem parte dos trabalhos. Richard Beasley, professor de medicina do Instituto de Pesquisa Médica da Nova Zelândia, esta finalizando um estudo aleatório controlado de 12 semanas sobre o paracetamol para verificar se a droga provoca ou piora a asma de pessoas adultas. Os resultados do estudo estarão prontos no ano que vem. Segundo Beasley, a principal prioridade agora são estudos rigorosos para verificar se o uso do paracetamol por crianças aumenta o risco de desenvolver a asma.
"Não posso dizer com total certeza se o paracetamol agrava a asma, mas posso dizer que, se eu tivesse um filho ou filha com asma, eu daria a ele ou ela ibuprofeno a partir de agora", afirmou McBride. "O ônus da prova agora é mostrar que ele é seguro", afirma.
Nem todos os especialistas concordam com isso.
"Neste momento, eu não sinto que seja possível recomendar um em substituição ao outro", afirmou Stanley Szefler, chefe de farmacologia clínica pediátrica do National Jewish Health, em Denver. "Os dois possuem vantagens e inconvenientes", afirmou.
Moderação
A aspirina e outros medicamentos anti-inflamatórios não esteroides, incluindo o ibuprofeno, são conhecidos por provocar ataques de asma em algumas pessoas, afirmou Beasley. Ele sugeriu aos pais um meio-termo: usar o paracetamol apenas moderadamente.
"Nós devemos reservar o paracetamol para tratar febres muito altas ou aliviar dores fortes, afirmou. "Sabemos que o paracetamol é usado bem mais amplamente: quando a criança está um pouco irritada ou começando a ter dentes ou sendo imunizada".
Foi demonstrado que o paracetamol reduz a resposta dos anticorpos à imunização, por isso, ele não deve ser administrado antes da vacinação de crianças, observou Beasley.
Szefler e seus colegas estão realizando um estudo que analisa as intervenções antecipadas para a asma e que também irá acompanhar os padrões da doença nas crianças que tomam paracetamol ou ibuprofeno para combater a febre. Os dados não irão responder a todas as perguntas, mas devem fornecer orientação adicional para pais e pediatras, afirmou Szefler.
McBride, por exemplo, não irá esperar pelos resultados.
"Se os estudos comprovarem que o paracetamol agrava a asma, não consigo me imaginar contando aos pacientes que eu sabia do fato há cinco anos, mas não tinha certeza e por isso não comentei", afirma.
Alguns pesquisadores notaram que a epidemia de asma aumentou rapidamente nos anos 80, aproximadamente na mesma época em que a aspirina foi associada à síndrome de Reye nas crianças. Os médicos pararam de receitar aspirina para as crianças com febre, optando pelo paracetamol.
Em um artigo publicado em 1992 no The Annals of Allergy and Asthma Immunology, Arthur Varner, então membro do programa de treinamento em imunologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Wisconsin, afirmou que a mudança para o paracetamol pode ter estimulado o aumento da asma. Desde então, mais de 20 estudos produziram resultados que apoiam essa teoria, incluindo uma extensa análise de dados de mais de 200 mil crianças que descobriu um aumento do risco de contrair asma entre aquelas que haviam tomado paracetamol.
O Dr. John T. McBride, pediatra do Hospital Infantil Akron de Ohio, publicou em novembro um artigo na revista Pediatrics no qual ele argumenta que as provas da associação entre paracetamol e asma são fortes o suficiente para que os médicos recomendem que se evite sua ingestão por bebês e crianças com asma, ou sob risco de contrair a doença.
Enzima
McBride baseou a sua declaração em diversas linhas de evidência. Ele afirma que, além do período de ocorrência da epidemia de asma, agora há uma explicação plausível para a forma como o paracetamol pode provocar ou piorar essa doença pulmonar inflamatória crônica. Os pesquisadores descobriram que mesmo uma única dose de paracetamol pode reduzir os níveis de glutationa do corpo. A glutationa é uma enzima que ajuda a reparar os danos oxidativos que podem levar à inflamação das vias aéreas.
"Quase todo estudo que procurou, descobriu uma relação dose/resposta entre o uso do paracetamol e a asma", afirmou McBride. "A associação entre idade, geografia e cultura é muito consistente", afirma.
A correlação estatística entre o paracetamol e a asma apareceu em estudos de bebês, crianças e adultos. Os estudos também descobriram um aumento no risco de contrair asma nas crianças cujas mães tomaram paracetamol durante a gestação.
Por exemplo, um estudo publicado em 2008 na revista The Lancet examinou informações sobre mais 205.000 crianças de 31 países, coletadas como parte de um Estudo Internacional sobre Asma e Alergias na Infância, conhecido como Isaac. A análise de 2008 concluiu que, nas crianças que receberam paracetamol com o intuito de baixar a febre no primeiro ano de vida, o risco de desenvolver os sintomas da asma era 50 por cento maior do que nas crianças que não haviam tomado o medicamento. O risco aumentava com o aumento do uso: o risco de apresentar os sintomas triplicou nas crianças que haviam tomado paracetamol ao menos uma vez a cada mês.
No estudo publicado em 2000 por pesquisadores britânicos, no qual foram usados dados do Isaac, descobriu-se que a prevalência da asma aumentava ao mesmo tempo que as vendas de paracetamol nos 36 países analisados. Quanto maior era o consumo de paracetamol de um país, tanto maior era a prevalência da asma.
A meta-análise publicada em 2009 avaliou que, nas crianças que haviam tomado paracetamol no ano anterior, o risco de sofrer de respiração ofegante duplicava quando comparado ao risco nas crianças que não haviam tomado o medicamento.
Infecção viral
"Nós sabemos que o paracetamol pode levar ao aumento da constrição brônquica e da respiração ofegante", afirmou Mahyar Etminan, farmacoepidemiologista da Universidade de Colúmbia Britânica e principal autor do estudo.
Contudo, Etminan afirma que ainda não está claro se o paracetamol em si é o responsável pelo aumento da prevalência de asma.
"As crianças geralmente recebem paracetamol para controle da febre, e ficam com febre devido a infecções virais, as quais estão associadas ao desenvolvimento da asma em uma idade mais avançada", afirmou Etminan. "É difícil elucidar se é o medicamento ou a infecção viral", afirma.
Outro problema potencial consiste no fato de que, em muitos estudos, os pais precisavam se lembrar com exatidão a quantidade de paracetamol oferecida à criança e a frequência. Os pais cujos filhos têm asma estão propensos as investigar os eventos que precedem o ataque, portanto, é maior a possibilidade de se lembrarem de ter oferecido o remédio a criança.
Apenas um estudo controlado aleatório investigou essa relação até o momento. Pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de Boston designaram 1.879 crianças com asma aleatoriamente a tomarem paracetamol ou ibuprofeno se tivessem febre. Os resultados, publicados em 2002, mostraram que as crianças que tomaram paracetamol para combater a febre estavam duas vezes mais propensas a procurar ajuda médica mais tarde para tratar os sintomas da asma do que as que tomaram ibuprofeno.
Outros estudos fazem parte dos trabalhos. Richard Beasley, professor de medicina do Instituto de Pesquisa Médica da Nova Zelândia, esta finalizando um estudo aleatório controlado de 12 semanas sobre o paracetamol para verificar se a droga provoca ou piora a asma de pessoas adultas. Os resultados do estudo estarão prontos no ano que vem. Segundo Beasley, a principal prioridade agora são estudos rigorosos para verificar se o uso do paracetamol por crianças aumenta o risco de desenvolver a asma.
"Não posso dizer com total certeza se o paracetamol agrava a asma, mas posso dizer que, se eu tivesse um filho ou filha com asma, eu daria a ele ou ela ibuprofeno a partir de agora", afirmou McBride. "O ônus da prova agora é mostrar que ele é seguro", afirma.
Nem todos os especialistas concordam com isso.
"Neste momento, eu não sinto que seja possível recomendar um em substituição ao outro", afirmou Stanley Szefler, chefe de farmacologia clínica pediátrica do National Jewish Health, em Denver. "Os dois possuem vantagens e inconvenientes", afirmou.
Moderação
A aspirina e outros medicamentos anti-inflamatórios não esteroides, incluindo o ibuprofeno, são conhecidos por provocar ataques de asma em algumas pessoas, afirmou Beasley. Ele sugeriu aos pais um meio-termo: usar o paracetamol apenas moderadamente.
"Nós devemos reservar o paracetamol para tratar febres muito altas ou aliviar dores fortes, afirmou. "Sabemos que o paracetamol é usado bem mais amplamente: quando a criança está um pouco irritada ou começando a ter dentes ou sendo imunizada".
Foi demonstrado que o paracetamol reduz a resposta dos anticorpos à imunização, por isso, ele não deve ser administrado antes da vacinação de crianças, observou Beasley.
Szefler e seus colegas estão realizando um estudo que analisa as intervenções antecipadas para a asma e que também irá acompanhar os padrões da doença nas crianças que tomam paracetamol ou ibuprofeno para combater a febre. Os dados não irão responder a todas as perguntas, mas devem fornecer orientação adicional para pais e pediatras, afirmou Szefler.
McBride, por exemplo, não irá esperar pelos resultados.
"Se os estudos comprovarem que o paracetamol agrava a asma, não consigo me imaginar contando aos pacientes que eu sabia do fato há cinco anos, mas não tinha certeza e por isso não comentei", afirma.