Bento XVI deixou Vaticano para ser "um simples peregrino"

Bento XVI deixou Vaticano para ser

Sem atraso, às 16h, o Papa deixou o Vaticano. Cerca de meia hora depois chegou à residência de Verão, na região de Castel Gandolfo, a 30 quilómetros de Roma. À sua espera estava uma multidão, a quem dirigiu umas últimas palavras na sua aparição final como Papa.

Após uma curta viagem de carro desde o Palácio Apostólico do Vaticano, Bento XVI entrou no helicóptero acompanhado pelo seu secretário Georg Gänswein, bem como por Leonardo Sapienza, novo regente da Casa Pontifícia, Patrizio Polisca, o seu médico, e Sandro Mariotti, o seu mordomo. Às 16h24, o helicóptero da República Italiana com uma bandeira com a insígnia do Vaticano, chegou a Castel Gandolfo. Cerca de sete minutos depois, transportado numa viatura negra, Bento XVI chegou à residência de Verão, onde vai permanecer cerca de dois meses antes de se instalar num mosteiro no alto dos jardins do Vaticano.

Naquela que é a sua última aparição pública após quase oito anos de Pontificado, já da varanda da residência de Castel Gandolfo, Bento XVI saudou a população. "Como sabem este dia é diferente dos anteriores. Só serei o Sumo Pontífice da Igreja Católica até às 20h [19h, hora de Lisboa]. Depois não serei mais um Papa mas um simples peregrino que termina a sua peregrinação nesta terra", disse, aplaudido por milhares de fiéis.

“Quero ainda com o meu coração, com o meu amor, com a minha oração, com a minha reflexão, com todas as minhas forças interiores, trabalhar para o bem comum, para o bem da Igreja e da humanidade”, disse ainda. "Boa noite, obrigado a todos”, foram as suas últimas palavras.

Ainda no Twitter, Bento XVI deixou outra mensagem de despedida: "Obrigado pelo vosso amor e o vosso apoio! Que experimentem sempre a alegria de ter Cristo no centro da vossa vida".

Às 20h locais (19h em Portugal) abandona oficialmente a função, à mesma hora a que todos os dias abandonava a sua actividade. A partir daí, assumirá o título oficial de "Sua Santidade Bento XVI, Papa emérito". A sua renúncia oficial inaugura o período de “sede vacante”, ficando no comando da Igreja, até à eleição do novo Papa, o cardeal Tarcisio Bertone.

Camerlengo desde Abril de 2007, Bertone, 78 anos, italiano de Piemonte, colaborou com o então cardeal Ratzinger entre 1995 e 2002, quando este desempenhava as funções de prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Em 2006 foi nomeado secretário de Estado, uma espécie de “chefe de governo” e número dois da Santa Sé. O seu nome tem surgido associado a jogos de poder no Vaticano.

"Obediência incondicional" ao novo Papa

Antes deste último passo, de manhã, o Papa prometeu “obediência incondicional” ao seu sucessor. “Está entre vós o próximo Papa, ao qual prometo deferência e obediência incondicionais”, disse, numa breve declaração, na cerimónia de adeus aos cardeais.

Depois da derradeira despedida frente aos fiéis na Praça de São Pedro, na quarta-feira, Bento XVI recebeu, na solene Sala Clementina, para um último adeus, os cardeais com poder para eleger o sucessor. Disse-lhes que, no próximo conclave, estará junto deles “pela oração”.

O Papa chegou à Sala Clementina caminhado com pequenos passos, rosto marcado pela fadiga. Sentou-se depois num pequeno trono dourado coberto de veludo vermelho, e dirigiu-se aos cardeais.

Na sua intervenção, falou de “momentos muito belos e de momentos em que houve nuvens no céu” – alusão aos escândalos que abalaram a Igreja Católica nos últimos anos – e desejou que os cardeais sejam “uma orquestra” em que “as diversidades concorram para a harmonia”. Agradeceu  “a proximidade”, “os conselhos” e a “grande ajuda” que os cardeais lhe deram e convidou-os a serem “dóceis” para o Espírito Santo.

Bento XVI disse também que “a Igreja não é uma instituição mas uma realidade viva”, que “o seu coração é Cristo […] e Cristo continua a caminhar no tempo”. A Igreja, acrescentou, “está no mundo mas não é do mundo”.

Os cardeais foram depois saudá-lo. Segundo a descrição da AFP, muitos choravam ou estavam à beira das lágrimas, ao beijarem o anel papal, ao apertar-lhe as mãos, ao trocarem palavras com ele.

O decano dos cardeais, Angelo Sodano, prestou homenagem a Joseph Ratzinger, pelo “testemunho de abnegação no serviço apostólico, para o bem da Igreja de Cristo e de toda a humanidade”.