As guerras servem para vender armas. Tem repercutido enormemente a denúncia do Papa Francisco no Angelus deste domingo contra o tráfico das armas que alimentam as guerras, em particular, a que está martirizando a Síria. Há anos particularmente empenhado no combate a essa chaga, o observador permanente da Santa Sé no escritório da ONU em Genebra, na Suíça, Dom Silvano Maria Tomasi, foi entrevistado pela Rádio Vaticano:
Dom Silvano Maria Tomasi:- "Parece-me mais do que nunca oportuno que o Santo Padre chame a atenção do mundo para o tráfico ilegal de armas. Os violentos conflitos – e vemos tantos nestes dias – e as armas caminham juntos. Não se busca a paz recorrendo aos meios de destruição, mas a comunidade internacional investe recursos sem proporção em despesas militares. Em 2012 foi investido 1 trilhão 750 bilhões de dólares em despesas militares; 8% da cifra global diz respeito ao Oriente Médio. É como jogar 'lenha na fogueira'..."
RV: As armas aos sírios, Assad e rebeldes, lhes foram fornecidas por indústrias de países estrangeiros. Isso faz com que acabe sendo o grande lobby das armas a decidir em favor das guerras?
Dom Silvano Maria Tomasi:- "O lucro torna-se a lei suprema. Há enormes ganhos que são feitos mediante o tráfico de armas. Portanto, há quem joga 'lenha na fogueira' para poder vender mais armas. Ademais, creio que se possa fazer outra consideração: ignoram-se as consequências, a longo prazo, do comércio de armas; as armas continuam reforçando a criminalidade e alimentando os diferentes tipos de máfia. Como disse o Papa, os interesses comerciais exercem um papel importante na transferência de armas, mas existe aí o ganho dos traficantes e até mesmo interesses económicos de Estados que produzem e vendem armas, como os EUA, a Rússia, a Inglaterra, a França, a Alemanha, Israel, China e outros. São Estados onde a indústria da produção de armas é um componente significativo da economia."
RV: O presidente estadunidense Eisenhower – que como general venceu a II Guerra Mundial – chegou a afirmar que "devemos nos proteger das influências exercidas pelo complexo militar-industrial". Essa é uma denúncia sempre actual e, talvez, mais ainda neste momento...
Dom Silvano Maria Tomasi:- "A ligação entre o complexo industrial e militar é real e exerce um peso político desproporcional no interesse do bem comum de um país, sobretudo dos grandes países desenvolvidos. A comunidade internacional continua falando de paz. Portanto, deveria ser a prioridade número um dos esforços internacionais facilitar tudo aquilo que constrói paz. Ao invés, constatamos que há um desenvolvimento ligado à produção de armas que alimenta certos sectores da economia."
RV: Ademais, há um dado totalmente evidente: as armas são produzidas pelos países "ricos e desenvolvidos", e depois essas armas vão parar nas "guerras dos pobres"...
Dom Silvano Maria Tomasi:- "A experiência nos mostra que onde não há democracias consolidadas, o acúmulo de armas – compradas com todos os meios legais e ilegais – serve para manter pequenas elites no poder, que certamente não respondem ao bem comum de seu povo."