Francisco dedicou a sua primeira mensagem da Quaresma ao tema da pobreza, apresentando a luta contra a miséria “material, moral e espiritual” como campo prioritário da ação da Igreja Católica, para curar as “chagas que deturpam o rosto da humanidade”.
“Quando o poder, o luxo e o dinheiro se tornam ídolos, acabam por se antepor à exigência duma distribuição equitativa das riquezas. Portanto, é necessário que as consciências se convertam à justiça, à igualdade, à sobriedade e à partilha”, refere o texto, divulgado pelo Vaticano, com o título ‘Fez-Se pobre, para nos enriquecer com a sua pobreza’, inspirado numa passagem da segunda carta de São Paulo aos Coríntios.
O documento sublinha que a miséria “não coincide com a pobreza”, mas é “a pobreza sem confiança, sem solidariedade, sem esperança”.
“Quantas pessoas se veem constrangidas a tal miséria por condições sociais injustas, por falta de trabalho que as priva da dignidade de poderem trazer o pão para casa, por falta de igualdade nos direitos à educação e à saúde”, lamenta o Papa.
Francisco recorda todos os que vivem “numa condição indigna da pessoa”, privados de direitos fundamentais e bens de primeira necessidade como “o alimento, a água, as condições higiénicas, o trabalho, a possibilidade de progresso e de crescimento cultural”.
“O nosso compromisso orienta-se também para fazer com que cessem no mundo as violações da dignidade humana, as discriminações e os abusos, que, em muitos casos, estão na origem da miséria”, acrescenta Francisco.
A mensagem observa que “não menos preocupante” é a miséria moral, apresentada como uma escravatura “do vício e do pecado”.
“Quantas famílias vivem na angústia, porque algum dos seus membros – frequentemente jovem – se deixou subjugar pelo álcool, pela droga, pelo jogo, pela pornografia”, alerta.
O Papa mostra-se próximo das pessoas que “perderam o sentido da vida” e “perderam a esperança”.
“Nós, cristãos, somos chamados a ver as misérias dos irmãos, a tocá-las, a ocupar-nos delas e a trabalhar concretamente para as aliviar”, apela.
Francisco liga a miséria moral à espiritual, que define como afastamento de Deus e recusa do seu amor, convidando a Igreja a enfrentá-la “corajosamente”, com “novas vias de evangelização e promoção humana”.
“O Evangelho é o verdadeiro antídoto contra a miséria espiritual”, prossegue.
O Papa questiona os católicos sobre o sentido atual do “convite à pobreza, a uma vida pobre em sentido evangélico”, que não consiste numa opção pela “pobreza em si mesma”, mas num “modo” de amar o outro, à imagem de Jesus.
“Poder-se-ia dizer que só há uma verdadeira miséria: é não viver como filhos de Deus e irmãos de Cristo”, sublinha.
Francisco fala na Igreja como “um povo de pobres” e diz que deve estar “pronta e solícita para testemunhar, a quantos vivem na miséria material, moral e espiritual, a mensagem evangélica, que se resume no anúncio do amor do Pai misericordioso, pronto a abraçar em Cristo toda a pessoa”.
A Quaresma, que se inicia esta quarta-feira, com a celebração de Cinzas, é um período de 40 dias, excetuando os domingos, marcado por apelos ao jejum, partilha e penitência, que serve de preparação para a Páscoa, a principal festa do calendário cristão.
“Não esqueçamos que a verdadeira pobreza dói: não seria válido um despojamento sem esta dimensão penitencial. Desconfio da esmola que não custa nem dói”, escreve o Papa.